sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

CAÇADAS NA MANTIQUEIRA


Mira Antunes Diniz


“As pessoas têm medo das mudanças. Eu tenho medo que as coisas nunca mudem.”
C. Buarque 


Aconteceu comigo: Nas férias resolvi passar o mês de janeiro na casa de amigas em Bocaina de Minas, elas moram em um sítio a cerca de 30 Km da cidade. O sítio é uma RPPN – Reserva Particular do Patrimônio Natural – e em toda a área da reserva é proibido qualquer tipo de exploração da natureza, incluindo a caça e pesca. Basicamente deixa-se a natureza crescer zelando para que isso aconteça. Pois bem, numa manhã de domingo acordamos com caçadores dentro da terra, bem perto da casa. Ouvíamos os cachorros dos caçadores perseguindo algum animal, que poderia ser um jacu, pássaro em extinção; um veado; uma paca com filhotes; um tatu bola, também considerado animal em extinção, enfim, um animal que deveria estar protegido pela reserva. Ficamos com vontade de encontrar o dito cujo e lhe dizer poucas e boas, vestimos nossas botas e subimos o morro seguindo o barulho dos cachorros, não encontramos ninguém, mas gritamos avisando que chamaríamos a policia florestal e que era para eles voltarem para suas casas.


 A maioria dos caçadores perseguem os animais e entregam a caça para que os cães da raça perdigueiros estraçalhem o animal, estilo medieval cada cachorro puxa de um lado. Moral da história: caçadores entram em terras alheias, caçam por puro esporte e crueldade, e por fim, deixam o animal morto para os cachorros comerem.


Muitas pessoas que eu conheço passam por situações semelhantes, então pensei e em escrever um texto a respeito da caça. Quem deveria ler, provavelmente não vai, mas pelo menos fica registrada a tristeza com que muitas pessoas olham para as caçadas, que hoje em dia devem ser encaradas como atos de crueldade e egoísmo. Houve sim um tempo da história da humanidade em que a caça e a pesca eram atividades essenciais ao homem e muito mais, eram atividades necessárias à sobrevivência da espécie. E é nesse ponto que quero começar.




A HISTÓRIA DA CAÇA 


A prática da caça remete aos primórdios do desenvolvimento da humanidade. Caçar era um meio de obter alimentos para a subsistência e também o couro era utilizado no vestuário, na verdade quase nada era jogado fora, uma vez que o homem ainda não tinha desenvolvido a pecuária e vivia de coleta extrativista e caça. Já no período neolítico começam a ser encontrados vestígios de instrumentos utilizados na caça, como pontas de lanças e flechas de pedra lascada, pequenas facas de osso e até mesmo agulhas de espinhas de animais que eram usadas para costurar os couros que serviam como roupas e sapatos. Com o passar do tempo os instrumentos foram se aperfeiçoando; a roda e o fogo foram descobertos, assim como os metais, o que permite que armas, que eram utilizadas para caçar, fossem fabricadas de bronze e depois de ferro.


Com o desenvolvimento dos instrumentos e o passar do tempo, o significado da caça passa a ser outro, não só subsistência, mas uma forma de iniciar os jovens e demonstrar força e liderança perante o grupo. Nas sociedades indígenas, por exemplo, a bravura era reconhecida naquele que caçasse o maior e mais feroz animal.


Outro aspecto que merece ser lembrado é que para os povos antigos, a caça não era vista como esporte ou prazer, a vida animal estava profundamente ligada a existência da humanidade e por isso a visão que homens e mulheres tinham dos animais e da própria natureza era de reverência e respeito. Tanto que a teoria mais aceita sobre o porquê dos desenhos rupestres é que eram os caçadores que os desenhavam, assim poderiam dominar o animal através de um sentido mágico e espiritual.


Talvez umas das primeiras manifestações em que a caça é vista como esporte e como uma espécie de lazer é na Roma Antiga, nos espetáculos que ocorriam no Coliseu, chamados de venatio. Animais selvagens trazidos da África, em especial felinos como leões, leopardos e panteras; e ainda rinocerontes, hipopótamos, elefantes, girafas, crocodilos e avestruzes eram utilizados. Tal como as representações de batalhas famosas, cenários elaborados eram montados com árvores e edifícios.




A CAÇA HOJE 


Com um grande salto podemos dizer que com o passar do tempo caçar foi se tornando cada vez menos uma necessidade de sobrevivência, que atendia à humanidade no inicio do desenvolvimento, social, cultural e espiritual, para se tornar um esporte. Foi na França que nasceu o primeiro clube de caça, pessoas que se reuniam periodicamente para caçar. Os clubes de caça foram se tornando populares e se espalharam pelo mundo.


Atualmente muitos países possuem leis regulamentadoras, sobre a época, lugares e quais animais podem ser caçados, o que não impede que muitas pessoas pratiquem a caça ilegal, em áreas proibidas e em épocas de reprodução das espécies.  


Caçar, diriam alguns, remete a um instinto primitivo do homem, mas como falar em instinto? É claro que em algum momento da humanidade a caça foi necessária para a sobrevivência, mas, desde que os animais foram domesticados e iniciou-se a atividade da pecuária e agricultura e estas se desenvolveram, é difícil conceber a necessidade de caçar. Os seres humanos não estão mais no nível do instinto, desde que o trabalho existe e que a humanidade pode modificar a natureza, criar valor e com o excesso de seu trabalho fazer vendas e trocas, não é mais possível dizer que o homem age por instinto e sim por influências sociais criadas a partir de uma noção de civilidade que foi possível com o trabalho e com o desenvolvimento espiritual da humanidade.


 Há, também, quem diga que essa é uma questão de foro íntimo, que é um esporte, que gera prazer. Porém, olhando com um olhar amoroso se diria um prazer sádico, como o sofrimento de outro ser vivo pode ser prazeroso? Como matar um veado com um filhote, deixando o filhote morrer porque ainda precisa da ajuda da mãe pode gerar prazer? Ou uma paca, ou um lobo-guará animal ameaçado de extinção devido à caça, ou um jacu mesmo caso, ou um jacaré para fazer sapato, ou uma onça pintada para fazer casacos de pele luxuosos, ou uma baleia... Uma lista interminável poderia ser colocada aqui.


Caçar por esporte é uma completa falta de empatia e respeito a outras formas de vida no planeta terra. Homens e mulheres, cada vez mais, precisam ter consciência e adquirir consciência sobre o respeito que se deve a natureza, somos parte dela, sua destruição é intrinsecamente a destruição do ser humano.


Em casos de necessidade, de sobrevivência, caçar poderia ser permitido, mas uma caça que é feita tão por esporte que o animal morto e jogado aos cachorros para que eles o destrocem? Esse tipo de caça não cabe nos dias atuais, e mais do que isso, não pode ser admitida. Por fim fica a citação de Albert Schweitzer: “Quando o homem aprender a respeitar até o menor ser da criação, seja animal ou vegetal, ninguém precisará ensiná-lo a amar seus semelhantes”.






Lista de alguns animais ameaçados de extinção pela caça




Caça, pesca e outros abusos são uma ameaça séria para pássaros (37% de todas as espécies), mamíferos (34%), plantas (8% das espécies avaliadas), répteis e peixes marinhos.




Onça-pintada


Esse animal é contrabandeado pela procura de sua pelagem para fabricações casacos e tapetes. Ainda, além do contrabando, outros fortes elementos colaboram para o extermínio dessa espécie, tais como a caça ilegal, destruição do habitat  e a poluição do meio ambiente.
A Onça parda é um animal caracteristico de nossa região, Serra da Mantiqueira, e se encontra ameaçada de extinção como a onça Pintada, que não ocorre na Mantiqueira.



















Tatu peba: Esse animal também esta na tabela dos considerados extintos, em decorrência a caça. Esse animal é muito procurado pelos caçadores, devido a sua carne, onde é comercializada ilegalmente.







Lobo-Guará: Muitos fazendeiros caçam os lobos-guarás pensando que podem causar grandes prejuízos em seus rebanhos, assim, a caça causa a extinção dessa espécie.




Cachorro do Mato Vinagre: Esse animal já é considerado em extinção por causa das queimadas, do desflorestamento e da ocupação do homem em seu habitat.





 Cervo do Pantanal: Esse animal esta desaparecendo devido a caça ilegal. Os cervos são os principais alvos dos caçadores, que vão em busca de sua galhada. Na Serra da Mantiqueira não ocorre o Cervo do Pantanal, mas seu parente próximo que também é muito caçado e também se encontra ameaçado de extinção é o Veado Catingueiro.






Jacaré-de-papo-amarelo


Há 20 anos este réptil estava em risco de extinção por causa de seu couro, usado para fabricar calçados e bolsas. Graças ao manejo da população e à regulamentação da caça, o jacaré-de-papo-amarelo hoje pode ser visto em praticamente todo o país.




Peixe-boi


No Brasil, o peixe-boi é protegido por lei desde 1967 e sua caça e comercialização de produtos pode levar o infrator a até dois anos de prisão. São animais de hábitos solitários, raramente vistos em grupo fora da época de acasalamento.

Tantos outros animais são caçados ou assassinados em nossa região causando um desequilibrio na fauna  bastante significativo, hoje podemos observar um grande aumento na população de ratos e camondongos como resultado da matança de todos os tipos de cobras. Podemos observar também um grande aumento na população de jacús (apesar de sua caça predatória) devido ao desaparecimento de Tucanos e outros predadores.








Algumas referências: 


A referência sobre o primeiro clube de caça pode ser encontrada na enciclopédia Larousse Cultural no verbete “caça”. 


http://navegolandia.com/onca-pintada-e-outros-animais-em-extincao/


http://www.greennation.com.br/pt/dica/200/Equipe-GreenNation/Animais-em-extin-o-no-Brasil


http://www.portalsaofrancisco.com.br/alfa/meio-ambiente-extincao-das-especies/extincao-das-especies-2.php




http://www.recantodasletras.com.br/artigos/1467317 Curiosidade sobre as tribos indígenas brasileiras.


Sites acessados em janeiro de 2013.